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Dom Julio Endi Akamine

Inspiração bíblica

O fato de ser realmente Palavra de Deus, não nega o fato de que os autores inspirados permaneçam como genuínos autores e não sejam meros secretários

11 de Setembro de 2022 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
(Crédito: REPRODUÇÃO / INTERNET)

 

A Palavra de Deus está contida nas palavras da Escritura. Como é possível que um escrito nos dê acesso e nos coloque em contato pessoal com Deus? Isso só é possível porque a Bíblia não é um escrito qualquer. Os livros que formam a Bíblia são, todos eles, inspirados por Deus.

O que é inspiração bíblica? Como ela age no escritor inspirado? A inspiração bíblica suspende a consciência humana? Absorve e se substitui às faculdades humanas?

A inspiração bíblica é um carisma bem específico. Trata-se de um dom do Espírito Santo que impulsiona autores humanos a escrever. Não é um carisma para pregar, nem fazer milagres, tampouco prever o futuro. Trata-se de um carisma dado especificamente para escrever. Por isso o escrito que resulta da atividade humana tem uma qualidade peculiar: contém a verdade revelada por Deus. Por isso, podemos afirmar que a Sagrada Escritura tem por autor Deus sem negar que o hagiógrafo também escreva como verdadeiro autor.

Com efeito, o Espírito pode impelir para muitas ações específicas: inspirar uma decisão, sugerir uma oração, revestir de beleza e arrebatamento uma pregação, guiar um discernimento, revelar coisas futuras etc. Tudo isso o Espirito pode realizar nas pessoas.

Nós, porém, chamamos de inspiração bíblica somente o carisma ligado a escrever. Assim é o carisma da Inspiração bíblica que garante que o escrito exprime a vontade de Deus e pode ser chamado de “Palavra de Deus”.

Como a inspiração bíblica age nos autores humanos? Como o Espírito influencia o autor bíblico?

Deus inspirou os autores humanos dos livros sagrados. Para escrever os livros sagrados, Deus escolheu e serviu-se de homens, na posse das suas faculdades e capacidades, para que, agindo Ele neles e por eles, pusessem por escrito, como verdadeiros autores, tudo aquilo e só aquilo que Ele queria (CatIgCat 106).

O influxo do Espírito Santo sobre os autores inspirados não absorve nem destrói a ação dos autores humanos. Pelo contrário, preserva e assume o que é próprio deles: suas vivências, história pessoal, estilo, vocabulário, temperamento etc. Por isso os autores inspirados são autores genuínos e não meros instrumentos passíveis e extrínsecos da ação do Espírito. Assim, ao ler a Bíblia, podemos identificar características próprias da personalidade dos autores inspirados.

Você, por acaso, não nota que o jeito de escrever de São Mateus é diferente do de São Lucas? Que São Paulo tem um estilo diferente do de São João? Que o profeta Jeremias imprime ao seu escrito experiências pessoais, vivências e imagens diferentes das do profeta Zacarias? Como você mesmo pode constatar: o fato de ser realmente Palavra de Deus, não nega o fato de que os autores inspirados permaneçam como genuínos autores e não sejam meros secretários que só registram um ditado.

A doutrina da Inspiração bíblica, portanto, não deve ser confundida com fenômenos semelhantes à psicografia. Com efeito, no espiritismo, a psicografia é a faculdade dos médiuns, que escrevem sob a atuação de espíritos comunicantes. Eles escrevem com uma ou com ambas as mãos. O médium, no entanto, não toma nenhum conhecimento do que escreve e, às vezes, enquanto escreve, conversa com os assistentes.

A inspiração bíblica se distingue claramente desses fenômenos mediúnicos e seus semelhantes, porque os escritores humanos escreveram sob a atuação do Espírito Santo, como autores genuínos e não como secretários inconscientes de um ditado.

Dom Julio Endi Akamine é arcebispo metropolitano da Arquidiocese de Sorocaba