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Nildo Benedetti

Filmes da Netflix: ‘Um marido fiel’ (parte 1 de 5)

30 de Setembro de 2022 às 00:01
A diretora Barbara Topsoe-Rothenborg, hoje com 43 nos de idade
A diretora Barbara Topsoe-Rothenborg, hoje com 43 nos de idade (Crédito: DIVULGAÇÃO)

Este filme de 2022, dirigido pela dinamarquesa Barbara Topsoe-Rothenborg, vem caracterizado pela Netflix como “Negro, suspense, thriller”. Contudo, possibilita uma ampla e profunda discussão sobre o amor conjugal, como veremos nesta análise.

O filme conta a história de Christian, um empreiteiro bem sucedido, casado com Leonora. O casal tem um filho, Johan, de quase 18 anos de idade, que está se recuperando de uma doença longa e grave, que ocupou grande atenção e energia dos pais e que levou Leonora renunciar à careira de violinista.

Christian e a talentosa arquiteta Xenya, têm um relacionamento extraconjugal apaixonado. A pressão exercida por Xenya para que Christian abandone a família coloca-o em uma situação sem saída, porque, de um lado, quer recomeçar uma nova vida com a moça a quem ama e, de outro, é refém de Leonora, porque ela é sabedora de ilegalidades cometidas pelo marido na direção de sua empresa e as utilizará contra Christian se este a abandonar.

O filme é narrado pelo comissário de polícia que investiga o atropelamento e morte de uma mulher, mãe de três filhos, que estava correndo para se exercitar. Este policial elabora uma intrincada história de assassinato a partir de alguns elementos: descoberta do relacionamento de Christian com Xenya, o fato de Leonora seguir o marido quando este visita amigas da mulher e a mãe de Xenya, o desaparecimento de Xenya sem deixar pistas, a insegurança de Christian quando dá informações sobre o possível atropelador da mulher etc.

Tudo o que vemos no filme -- a tentativa de assassínio de Leonora por Christian, o assassínio de Xenya por Leonora, a queima do cadáver desta na fogueira etc. são conjecturas formuladas pelo comissário. Este representa o “narrador não confiável”, que aparece principalmente na literatura e no cinema sob vários propósitos, alguns como forma de mostrar ao leitor ou espectador que o criador é alguém talentoso, outros como recurso artístico realmente significativo para a interpretação da obra e enriquecimento das teses nela contida. Penso que o segundo seja o caso deste “Um marido fiel”.

A Dinamarca é um país de baixíssima taxa de homicídios e Copenhague figura no topo da lista das cidades mais seguras do mundo. Grande parte dos poucos assassinatos cometidos no país tem origem passional. Por isso, o comissário diz “Alertam-nos contra tudo: o tabaco, o álcool. Mas nunca contra o maior perigo de todos. Ou seja, o amor devia vir com uma advertência escrita: O amor mata.” Alerta a filha que vai casar de que ela pode estar correndo para os braços do inimigo, evidenciando assim sua forma de ver o casamento como uma instituição que pode ser perigosa, trazer enormes sofrimentos e mesmo a morte. Contudo, é preciso reconhecer no grande número de crimes passionais trazem indícios de que a história criada pelo comissário pode conter traços de realidade. Ou, quiçá, ser a própria realidade porque suas conjecturas sobre os acontecimentos decorrem de vasta experiência profissional.

Percorrerei um longo caminho para tentar compreender o pessimismo do comissário de polícia com respeito ao amor e ao casamento e, por isso, peço paciência ao leitor. Para tanto, sintetizarei quase literalmente o que escrevi no meu artigo “Alguns aspectos sobre desejo e amor tratados no cinema” do livro “Filmes para pensar, volume 2”.

Esta série de artigos está incluída no projeto Cine Reflexão da Fundec

nildo.maximo@hotmail.com