No futebol e na vida
Carlos Brickmann
Os comentários de futebol estão cheios de expressões repetidas: “uma caixinha de surpresas”, “fatores campo e torcida”, “quem não faz, leva”. Um time ataca, não consegue marcar, toma um gol no contra-ataque e perde a partida. A frase vale no futebol, vale na política. Mauricio Macri, empresário respeitado, chegou à Presidência da Argentina para acabar com a desordem e o desemprego dos tempos da família Kirchner. Não deu certo: o desemprego é alto, a economia vai mal, e Cristina Kirchner, uma espécie de Dilma que sabe falar, é favorita nas eleições de hoje. Vem de vice -- mas o líder da chapa é uma espécie de Haddad. É ela quem manda.
No Uruguai, a Frente Ampla, de esquerda, tem conseguido manter o país livre de crises. Deve manter-se no poder nas eleições de hoje. No Chile, o presidente Sebastián Piñera, liberal, não calculou os efeitos do segundo aumento do Metrô no ano e abriu campo para grandes manifestações de rua. Piñera ganhou com a promessa de corrigir os erros do Governo socialista anterior. Hoje precisa dos socialistas para ajudá-lo a conter as ruas.
No Brasil, Lula pode ser libertado logo e se dedicar a reorganizar o PT. Enquanto isso, o presidente Bolsonaro e seus filhos se dedicam a brigar com os aliados, trocando insultos em público. O desemprego se mantém alto, a economia não decola, as reformas andam a passo lento. Os ex-aliados sabem muito e podem resolver falar. E há CPIs, que são sempre um bom palco.
Notícias arranjadas
Uma CPI que já está na praça é a das fake news, as informações falsas amplamente divulgadas por militantes e robôs. Pois Joice Hasselmann, há pouco escolhida para ser a nova vítima do trio 000, está reagindo. Já citou o Gabinete do Ódio, um grupo de profissionais liderado pelo filho 02, Carluxo, que se dedica a pesquisar o noticiário em busca de aliados que possam ser transformados em inimigos. Joice é inteligente, ativa, não teme a briga. Quer se candidatar à Prefeitura de São Paulo pelo PSL, caso os Bolsonaros saiam do partido, ou por outra legenda. A CPI das Fake News é um ótimo palco.
Peso e agilidade
Joice já inicia os depoimentos em situação de vantagem, como vítima de uma campanha asquerosa, que a agride e busca ridicularizá-la por estar acima do peso. Para quem, como ela, se habituou no Paraná a enfrentar o feroz senador Roberto Requião, brigar com o Trio 000 é tranquilo. As fake news têm limite: uma mulher agredida por homens vai sempre levar vantagem.
BNDES na mira
Outra CPI que pode ter grande repercussão é a do BNDES. Em princípio, o Governo Bolsonaro está fora de sua mira. O foco da CPI é a caixa preta do BNDES, com seus empréstimos em ótimas condições a empresas e a países escolhidos pelo Governo do PT para ganhar benefícios. Há empréstimos para grandes obras em ditaduras africanas, Cuba, Venezuela, sempre executadas por empreiteiras nacionais suspeitíssimas de destinar boa parte de seu superfaturamento a políticos ligados aos governos brasileiros da época.
Vai e vem
Mas até nesta CPI do BNDES, que tem tudo para atingir adversários do atual Governo, pode sobrar para Bolsonaro. O BNDES não conseguiu ainda devolver ao Tesouro os empréstimos que deveria restituir neste ano. E, embora Bolsonaro tenha mandado abrir a caixa preta do BNDES, até agora os mistérios continuam. A CPI e o livro podem contribuir para sanar a falha.
Carlos Brickmann é jornalista ([email protected])