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Editorial

A fé que move a política

16 de Setembro de 2024 às 22:00
Cruzeiro do Sul [email protected]
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O Brasil é um Estado laico. Isso significa que o País não está oficialmente ligado a nenhuma religião e que todas as religiões têm a proteção do Estado.

A laicidade do Brasil foi estabelecida com a Proclamação da República, em 1889, e consolidada com a promulgação do Decreto 119-A, em 7 de janeiro de 1890. A Constituição Federal de 1891 também garantiu a liberdade religiosa e retirou do governo a adoção de uma posição religiosa oficial.

Mesmo assim, religião e política têm se misturado. É comum em época de eleição — como agora — surgir candidatos que se apresentam ao eleitor com o título religioso que carregam como “pastor”, “apóstolo”, “bispo” ou “padre”, por exemplo. A influência da religião na política tem aproximado, a cada dia, os candidatos da igreja.

Essa proximidade tem sido positiva a postulantes de cargos eletivos que usam suas bases religiosas para convencer eleitores a darem a eles o seu voto. Por isso mesmo, de uns tempos para cá, é proibida a realização de propaganda eleitoral em bens de uso comum, sobretudo no caso de igrejas e de templos religiosos. A regra é estabelecida no art. 37 da Lei das Eleições (Lei nº 9.504/97).

Mas nada disso tem inibido a mistura religião e política. Nos últimos dias, por exemplo, o Parlamento deu duas mostras disso. Uma delas é o reconhecimento das expressões artísticas cristãs como parte da cultura brasileira que foi oficializado com a publicação da Lei 14.969, de 2024, ontem (16), no Diário Oficial da União (DOU). A nova legislação, sancionada pelo Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, reconhece as influências do cristianismo na formação cultural do País.

Originária da Câmara dos Deputados, a lei passou pelo Senado na Comissão de Educação (CE), onde foi relatada pelo senador Esperidião Amin (PP-SC), que apresentou parecer favorável. Em seu relatório, Amin destacou que as influências do cristianismo estão presentes no Brasil desde o período colonial, permeando diversos aspectos da vida social e cultural do País. “Desde o início da colonização e pelos séculos seguintes de nossa história, a fé católica esteve presente, com suas igrejas e capelas, seus santos e festividades, sua arte sacra e sua música, tudo isso recebendo um caráter singular e único, próprio da vivência brasileira”, afirma o senador.

O segundo exemplo é a sanção, também pelo Presidente da República, da lei que cria o Dia Nacional da Pastora Evangélica e do Pastor Evangélico, a ser comemorado anualmente no segundo domingo do mês de junho (Lei 14.970, de 2024). O texto foi publicado no Diário Oficial da União (DOU) na última sexta-feira (13). A lei decorre do PL 4.029/2021, do ex-deputado federal por Goiás João Campos. Relatada pelo senador Zequinha Marinho (Podemos-PA), a matéria foi aprovada na Comissão de Educação e Cultura (CE) do Senado no último dia 13 de agosto.

Em seu relatório, Zequinha afirma que pastoras e pastores evangélicos são modelos inspiradores para suas congregações, “comprometidos em encorajar uma vida com princípios baseados na palavra, trazendo forte contribuição para a educação religiosa e formação espiritual”. Para ele, a instituição do Dia Nacional do Pastor e da Pastora “reconhece e honra aqueles que renunciam seus anseios pessoais e se dedicam a estudar as diretrizes bíblicas, aperfeiçoando seu conhecimento histórico e filosófico” para dar amparo sólido a suas respectivas congregações. O senador modificou a proposta para deixar clara a inclusão das mulheres pastoras na homenagem.

O Dia Nacional da Pastora Evangélica e do Pastor Evangélico já é comemorado em boa parte das igrejas e já consta do calendário oficial de alguns municípios. De acordo com os dados do Censo de 2010, pouco mais de 22% da população se declarava evangélica naquele ano. Os dados sobre religião do Censo 2022 do IBGE estão sendo processados e ainda não foram divulgados. Segundo levantamento do Datafolha, 31% dos brasileiros se declaravam evangélicos em 2020.

Como se vê, “agradar” líderes religiosos, principalmente em ano eleitoral, é um bom negócio para os operadores da política.