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Editorial

Pensão vitalícia questionável

20 de Setembro de 2024 às 21:53
Cruzeiro do Sul [email protected]
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Algumas decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) provocam reações, digamos, no mínimo polêmicas, tanto no âmbito político, como econômico e até mesmo popular, principalmente quando os ministros avançam em assuntos que são de atribuições dos poderes Executivo e Legislativo.

Uma decisão dessa semana, em especial, provocou muitas críticas e questionamentos. Por quatro votos a um, os ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal mandaram restabelecer a pensão vitalícia do ex-governador de Mato Grosso, Moisés Feltrin, que ficou no cargo por 33 dias em 1991. Os ministros ainda determinaram o pagamento retroativo de parcelas que Feltrin não recebe desde novembro de 2018, quando o governo de Mato Grosso cortou os repasses acatando decisão da própria Corte máxima. Ou seja, contrariando entendimento anterior do Supremo.

O salário atual do governador de Mato Grosso é de R$ 30.862,79. Feltrin deverá receber R$ 33 mil. À época em que ocupou a cadeira no Palácio Paiaguás, sede do Executivo estadual mato-grossense, Feltrin, então filiado ao PFL, exercia mandato de deputado estadual e presidia a Assembleia Legislativa de Mato Grosso.

Feltrin assumiu o governo porque o governador Carlos Bezerra renunciou. Ao mesmo tempo, o vice Edison Freitas de Oliveira se afastou por problemas de saúde. Após breve período no poder, Feltrin transmitiu o cargo para o novo governador eleito Jayme Campos.

A partir de 1999, Feltrin passou a receber a pensão vitalícia. Em 2018, porém, o próprio STF cortou o privilégio a ex-chefes de Executivo no bojo de uma ação movida pela Ordem dos Advogados do Brasil 15 anos antes, em 2003.

Ao acionar o STF, a Ordem citou especificamente o caso de Feltrin que, à época, há 21 anos, recebia R$ 12.582,00 mensais.

No julgamento que agora restabelece a pensão vitalícia a Feltrin, os ministros Dias Toffoli, André Mendonça e Kassio Nunes Marques seguiram o posicionamento do decano Gilmar Mendes. Ele destacou as “peculiaridades fáticas” do caso — apesar de o próprio STF ter declarado inconstitucional o pagamento de pensão a ex-governadores.

Restou vencido o ministro Edson Fachin, relator, que argumentou a impossibilidade de o colegiado rediscutir uma decisão já tomada pelo plenário.

Gilmar frisou que, quando pediu ao STF o restabelecimento de sua pensão, Feltrin estava com 81 anos e já recebia o benefício suspenso pelo governo de Mato Grosso havia mais de 20 anos — desde 1999.

“Não há cruzada moral que justifique, à luz das garantias constitucionais, a abrupta supressão do benefício recebido de boa-fé durante décadas por pessoa idosa, sem condições de reinserção no mercado de trabalho”, justificou Gilmar.

Na avaliação do ministro, a pensão paga ao ex-governador não é um “privilégio odioso”, mas um “benefício de caráter alimentar recebido há anos por indivíduo que, tendo confiado na legislação e na administração, já não mais tem condições de suprir, em razão da avançada idade, suas necessidades no mercado de trabalho”.

Gilmar invocou outros casos em que o STF determinou o restabelecimento de pensões de ex-governadores e ponderou que, considerando a garantia constitucional da segurança jurídica e do princípio da proteção legítima, não é mais possível rever o benefício a Feltrin.

Para o decano, o fato de o ex-governador Moisés Feltrin ser idoso, sem possibilidade de reinserção no mercado de trabalho e ter recebido a pensão por longo período justifica a manutenção dos repasses mensais.

A decisão foi dada durante julgamento virtual de um pedido de Feltrin. Ele requereu o restabelecimento da pensão, barrada após o Supremo declarar inconstitucional o pagamento do benefício a ex-governadores.

Apesar de todas as alegações que determinaram a decisão favorável a Feltrin, a ética moral foi sim ferida, contrariando o que pensa Gilmar Mendes. E sim uma decisão questionável. É por privilégios como esse, que saqueiam os cofres públicos em benefício do indivíduo que o Estado não consegue reunir recursos para atender o coletivo. É por isso que o sistema previdenciário — seja ele do INSS ou regime próprio — está capengando. É um absurdo alguém que serviu um Estado por 33 dias ganhar pensão vitalícia, enquanto muitos cidadãos comuns mendigam dias para conseguir se aposentar neste País.