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Editorial

Inviolabilidade do direito à vida

15 de Novembro de 2024 às 21:41
Cruzeiro do Sul [email protected]
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Tramita na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados, em Brasília, a proposta de emenda à Constituição que garante a inviolabilidade do direito à vida desde a concepção (PEC 164/12).

A matéria estava na pauta da Comissão para votação na quarta-feira (13), mas vários deputados pediram vista da proposta, o que acabou adiando a discussão.

A Constituição já garante a todos os brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, mas não há definição do momento em que esse direito começa a vigorar.

A proposta de emenda à Constituição pretende determinar que esse direito passe a valer a partir da concepção do feto, e não do nascimento do bebê.

Na prática, a proposta proíbe o aborto no Brasil nas situações hoje autorizadas em lei. Atualmente, o aborto é permitido em três casos no País: risco de morte para a gestante, gravidez resultante de estupro e anencefalia fetal (má-formação do cérebro).

Na quarta-feira, momentos antes do adiamento da votação, a relatora da matéria legislativa, deputada Chris Tonietto (PL-RJ), leu seu parecer pela admissibilidade da proposta. “Não se vislumbram quaisquer incompatibilidades entre a alteração que se pretende realizar e os demais princípios e regras fundamentais que alicerçam a Constituição vigente e nosso ordenamento jurídico”, apontou a parlamentar.

Pelo trâmite, os integrantes da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados só avaliam se a proposta está de acordo com a Constituição e as leis brasileiras. Aprovado esse quesito, o mérito da mudança segue para discussão em uma comissão especial.

O assunto demanda debates acalorados entre os favoráveis ao abordo e os contrários.

Cerca de 20 novos projetos de lei sobre aborto foram apresentados na Câmara dos Deputados após a polêmica causada pela proposta que equipara a pena para a interrupção da gestação acima de 22 semanas à de homicídio — 20 anos de prisão —, mesmo para mulheres vítimas de estupro (PL 1904/24). Essa pena é maior do que a prevista para o estuprador, de até 10 anos de prisão, um dos pontos mais polêmicos do texto.

Depois que o Plenário da Câmara aprovou, em junho, a urgência para o PL 1904/24, causando forte reação de setores da sociedade, o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), anunciou a criação de uma comissão com representantes de todos os partidos para debater o texto neste segundo semestre. Mas, o ano está acabando e o assunto patina no parlamento.

Os novos projetos apresentados reforçam uma tendência no debate legislativo na Câmara de tornar a legislação sobre o aborto mais rígida.

No Brasil, o primeiro projeto de lei relativo ao aborto foi apresentado ao Congresso Nacional em 1949. A proposta restringia o direito de as mulheres interromperem a gravidez.

Pelo Código Penal, em vigor desde 1940, somente era permitido o aborto nos casos de gravidez por estupro e de risco de vida para a gestante. O projeto em questão retirava essas duas possibilidades, estabelecendo a proibição total do aborto no País.

A proposta de 75 anos atrás foi redigida por um deputado federal, o monsenhor Arruda Câmara (PDC-PE). Na visão dele, os dois tipos de aborto legal desrespeitavam “a moral católica do povo brasileiro” e abriam a porta para “todos os outros atentados à vida do nascituro”.

Os deputados, no entanto, nem chegaram a discutir o tema. O projeto do padre foi engavetado sem passar por nenhuma comissão da Câmara.

Quem identificou o projeto de lei pioneiro foi Maria Isabel Baltar da Rocha Rodrigues, feminista, socióloga e professora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) falecida em 2008.

De acordo com a pesquisa dela, foram 18 as propostas relativas ao aborto apresentadas à Câmara e ao Senado entre 1946 e 1983, a maioria contrária à interrupção da gravidez.

A verdade é que o assunto — polêmico — não encontra unanimidade no Parlamento, justamente o local onde são determinados os regramentos para manter a ordem no País. Essa discussão, em particular, envolve o debate sobre ética, direito, liberdade, responsabilidade e poder. Por isso, talvez a resolução se arrasta há tempos.