Fora de foco
Na última quinta-feira, os vereadores da Câmara de Sorocaba deveriam ter iniciado a análise do Orçamento de 2020 na sessão ordinária do Legislativo, uma atividade que já estava agendada previamente. Não foi possível.
A ausência de vereadores na hora da votação obrigou o presidente da Câmara, Fernando Dini (MDB), com a concordância do plenário, a cancelar a sessão.
Seria uma das mais importantes sessões do ano, mas mesmo assim o número de vereadores ausentes impossibilitou a continuação dos trabalhos.
No momento da chamada, 12 vereadores estavam em plenário, um número superior ao da denominada maioria simples, que necessita a presença de 11 vereadores; mas para que o texto pudesse ser analisado eram necessárias as presenças de 14 parlamentares, chamada de maioria qualificada.
Apenas dois dos 20 parlamentares haviam justificado as ausências, uma vereadora que se encontrava doente e um vereador que representava o Legislativo em outro evento.
Seis vereadores ausentaram-se sem apresentar qualquer justificativa.
O cancelamento de uma sessão particularmente importante deixou o presidente da Casa constrangido. Dirigindo-se aos jornalistas que cobrem o Legislativo, Fernando Dini disse que o motivo do cancelamento -- a falta de vereadores no plenário -- é vexatório, pois havia quórum para a sessão, mas não para a votação.
No período da tarde, depois da péssima repercussão do caso, alguns dos vereadores ausentes do plenário, mas que se encontravam no prédio da Câmara apresentaram suas justificativas.
A maioria disse que naquele momento atendia a eleitores nos gabinetes ou outras dependências da Câmara.
O esvaziamento da sessão e seu cancelamento teve repercussão negativa. Quase ao mesmo tempo surgiram manifestações nas redes sociais criticando os ausentes e cobrando maior dedicação dos parlamentares.
O líder do governo na Câmara, vereador Francisco Martinez (PSDB), chegou a sugerir ao presidente que a ausência dos vereadores fosse descontada de seus vencimentos.
Em tempos de redes sociais cada vez mais ativas, em que a repercussão de fatos como esse é praticamente imediata, o cancelamento de uma sessão importante do Legislativo sorocabano foi muito criticada, muitas vezes com ataques exagerados aos vereadores.
Mas os parlamentares precisam tomar mais cuidado para evitar situações como essa, mesmo porque estamos a menos de um ano das eleições municipais, e derrapadas como essa podem atrapalhar o projeto de reeleição de muitos deles.
As eleições de 2018 trouxeram muitas mensagens para os políticos brasileiros e precisam ser bem interpretadas. O desencanto com a classe política, um sentimento perceptível em boa parte da população, provocou nas últimas eleições um índice de renovação inédito na Câmara dos Deputados, atingindo 47,6%.
Em números proporcionais, foi a maior renovação desde a eleição para a Assembleia Constituinte, em 1986. No total, 243 deputados novos foram eleitos.
No Senado, a renovação foi ainda maior, chegando a 85%, o que significa que das 54 cadeiras em disputa, apenas oito foram ocupadas por senadores reeleitos.
A transmissão ao vivo das sessões pela TV Câmara e a agilidade das redes sociais deixam os vereadores bastante expostos à opinião pública.
O desempenho de cada parlamentar é facilmente medido pelos eleitores. No início do ano, por exemplo, teve grande repercussão a notícia de que dos 153 projetos de leis votados e aprovados pelos vereadores sorocabanos em 2018, 53 deles, aproximadamente um terço, foram de denominação de ruas, praças e próprios municipais e outros 19 foram projetos de criação de datas comemorativas, como o “Dia do Futebol”, por exemplo.
Não que os homenageados não mereçam tal honraria, longe disso. A cidade tem a obrigação de reverenciar seus cidadãos ilustres, mas esse tipo de projeto não deveria representar a maior parte do trabalho de muitos vereadores.
Quando um orçamento municipal estimado em R$ 3,3 bilhões tem sua análise postergada por falta de quórum, alguma coisa está errada. Pode indicar que muitos perderam a noção do que representa o trabalho do Legislativo.