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Engenheira analisa uso de ‘alga verde’ para cartilagens inflamadas e desgastadas

Algas verdes têm propriedades que ainda estão sendo descobertas pela ciência

21 de Setembro de 2022 às 08:30
Também conhecida como alface-do-mar, alga está presente em regiões costeiras e reservatórios com grande concentração de nutrientes
Também conhecida como alface-do-mar, alga está presente em regiões costeiras e reservatórios com grande concentração de nutrientes (Crédito: Jag Images – Adobe Stock)

A poetisa angolana Isabel Morais Ribeiro Fonseca certa vez escreveu: “Quando eu morrer, Sepulta-me no mar, Por entre as algas, E cobre o meu rosto, De palavras escritas, Num rasto de corais.” Algas são encontradas em abundância em águas tanto do mar quanto de reservatórios de água doce. Assim sabia a poetisa, como também a engenheira química Kessi Marie de Moura Crescencio, que em uma pesquisa pelo programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas da Universidade de Sorocaba (Uniso) buscou dar uma utilização para uma das espécies de alga.

Kessi Marie de Moura Crescencio, autora do estudo  - Fernando Rezende
Kessi Marie de Moura Crescencio, autora do estudo (crédito: Fernando Rezende)

Crescencio estudou a Ulva lactuca Linnaeus, que é uma alga verde encontrada em abundância nos ambientes aquáticos com alta concentração de nutrientes, como nas regiões costeiras e nos reservatórios de água doce, e que tem causado alguns problemas ambientais. O desenvolvimento e o resultado dessa pesquisa podem ser encontrados na dissertação “Extração e caracterização físico-química do ulvan (Ulva lactuca L.): uma plataforma para preparação de sistemas biomiméticos particulados”, desenvolvida pela pesquisadora sob a orientação do professor doutor Marco Vinícius Chaud.

Por existir em abundância e ser facilmente encontrada na natureza, a alga verde, do gênero Ulva, também conhecida como alface-do-mar, tem recebido, cada vez mais, a atenção de pesquisadores, segundo a engenheira química. “Esta biomassa de algas prolifera muito rapidamente em águas eutróficas (águas com alta concentração de nutrientes) de regiões costeiras e de reservatórios, sob a forma de ‘marés verdes’ levando à morte de organismos aquáticos por hipóxia”, diz.

Dentre as principais divisões de algas marinhas (as algas marrons, as verdes e as vermelhas), as algas verdes são as que menos foram estudadas, e, segundo a pesquisadora da Uniso, merecem essa análise por parte dos cientistas, pois estas algas possuem potencial nutritivo, e apresentam potenciais nutracêuticos, ou seja, essas algas possuem nutrientes que proporcionam benefícios à saúde, como atividade antioxidante, anticoagulante, antibacteriana, anticancerígena e antimutagênica.

Crescencio diz que, em decorrência dos problemas ambientais causados por esta alga, diversos estudos são desenvolvidos com o intuito de proporcionar o aumento da sua exploração comercial, principalmente em relação ao seu principal constituinte, o ulvan.

Ela explica que o ulvan é uma classe de polissacarídeos sulfatados presente na parede celular da Ulva lactuca. Estes polissacarídeos apresentam estrutura química semelhante a estrutura das glicosaminoglicanas, ácido hialurônico e sulfato de condroitina, que são utilizadas para a manutenção da homeostase e da integridade biomecânica de tecidos e fluidos que exercem funções fisiológicas, estruturais e lubrificantes. Além disto, a semelhança do ulvan com estas glicosaminoglicanas e a possibilidade de obter este material, a partir de recursos renováveis de baixo custo, têm atraído a atenção dos pesquisadores e proporcionado a obtenção de recursos para financiar este tipo de trabalho.

Em sua pesquisa, a engenheira química Crescencio trabalhou com a hipótese de que era possível obter sistemas polissacarídicos em forma de gel (gelificados) microestruturados ou nanoestruturados, similares ao ácido hialurônico ou ao sulfato de condroitina, a partir da gelificação do ulvan extraído da alga marinha Ulva lactuca. A outra hipótese explorada na pesquisa era de que a estrutura polimérica do ulvan poderia originar estes sistemas polissacarídicos gelificados a partir da reticulação com íons cálcio (Ca2+).

Depois de obter a alga a partir de uma parceria com os professores Paulo Antunes Horta Junior e Eduardo de Oliveira Bastos do Laboratório de Ficologia (LAFIC), da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em Florianópolis, a pesquisadora da Uniso trabalhou na extração, avaliação e caracterização do ulvan, e, depois, na obtenção e caracterização do hidrogel de ulvan.

Resultados

Os resultados finais obtidos por Crescencio em sua pesquisa mostraram que a metodologia utilizada foi eficiente para a realização da extração de ulvan, com alto grau de pureza, e para obtenção de um hidrogel de ulvan, a partir da reticulação do ulvan com íons cálcio (Ca2+). Porém, o hidrogel obtido não foi suficientemente adequado para que pudesse substituir o ácido hialurônico ou o sulfato de condroitina e ser utilizado em aplicações biomédicas. “O hidrogel de ulvan, que foi desenvolvido com o intuito de avaliar a capacidade de utilizar o ulvan para biomimetizar o efeito do ácido hialurônico e do sulfato de condroitina, não apresentou propriedades físicas, viscosimétricas e fisiomecânicas adequadas para a sua utilização como substituto destes polímeros. Desta forma, para que este material possa ser utilizado em aplicações biomédicas, como a aplicação em cartilagens articulares inflamadas e desgastadas, estas propriedades precisam ser aperfeiçoadas”, conclui a engenheira.

Com base na dissertação “Extração e caracterização físico-química do ulvan (Ulva lactuca l.): uma plataforma para preparação de sistemas biomiméticos particulados”, do Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas da Universidade de Sorocaba (Uniso), com orientação do professor doutor Marco Vinícius Chaud e aprovada em 27 de fevereiro de 2020. Acesse: https://uniso.br/mestrado-doutorado/farmacia/dissertacoes/2020/kessi.pdf

Texto: Marcel Stefano

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