Nelson Fonseca Neto
A jornada

A vida é meio corrida por aqui, mas a gente consegue se divertir nas brechas. Não sei por que usei “mas” e não “e”. Dá pra conciliar as coisas.
Quando o João Pedro capota, a Patrícia e eu muitas vezes passamos o resto da noite vendo abobrinhas ou falando sobre elas. Acho saudável sermos um casal de palhaços.
Estou escrevendo isto aqui na quarta-feira, perto das dez da noite. Estou na sala, com o computador na mesa de jantar, a Patrícia está ao lado, no sofá, vendo uns vídeos no celular. O João Pedro dorme pesado lá no quarto dele.
A televisão está ligada no noticiário de um canal da tv a cabo. Não sou dos que precisam de silêncio pra escrever. Vou dando umas bicadas nas notícias que interessam, comento algumas com a Patrícia, lembro de algo pitoresco que aconteceu hoje. Numa boa.
Hoje de manhã saímos um pouco da rotina. Somos professores. A Patrícia está na rede pública, e eu na particular. Já retornei ao trabalho, a Patrícia retorna na semana que vem. Ela está com as manhãs mais tranquilas até o fim desta semana.
As minhas manhãs já estão trepidantes. As aulas do João Pedro começaram na segunda-feira.
Neste ano, entro mais tarde às quartas-feiras. Nesta semana - com a Patrícia ainda em férias, com o João já na escola - isso fez com que o casal de docentes resolvesse tomar um café-da-manhã mais vagaroso, mais glamouroso. A gente gosta de uma firula de quando em quando.
Deixamos o João na escola perto das sete e meia. Eu entraria às nove. Bom intervalo para encontrarmos um lugar aprazível. Perto da escola do João tem um lugar bacana. A gente já estava salivando pensando no queijo quente na chapa e no café com leite.
Chegamos lá e demos com as portas fechadas. Cogitamos se a chuva da noite anterior tinha feito algum estrago. Entramos no carro e fomos a um outro lugar que eu sabia ser muito bom e que a Patrícia ainda não conhecia. Fui fazendo uma fervorosa propaganda no caminho. Caprichei nos elogios ao pão com ovo. Ovo é tudo de bom nesta vida, não? Eu viveria fácil à base de pão com ovo.
Estacionamos o carro perto da padaria, andamos alguns metros e topamos com a porta de correr meio aberta. Inclinei meu portentoso tronco a fim de ver o que estava rolando. Uma moça disse que estava esperando a colega pra botar a padaria pra funcionar.
O casal de palhaços lembrou de um outro café ali perto, era só virar a esquina e andar um tantinho. A gente aqui tem a mania de rir quando as coisas não caminham a contento. É um bom mecanismo de defesa. Rir de si mesmo pode ser terapêutico.
Finalmente achamos um lugar pra tomar café. Entramos, a dona tinha acabado de abrir o estabelecimento, fazia um calorão lá dentro. Gotas começaram a escorrer das minhas têmporas. A Patrícia e eu trocamos o típico olhar dos que foram derrotados pela vida. Ainda bem que a dona do café, notando nossas expressões, foi logo dizendo que o ar-condicionado já estaria funcionando.
E funcionou bem. E tomamos um café muito gostoso. E logo depois a correria veio de novo.