Press Enter and then Control plus Dot for Audio

Buscar no Cruzeiro

Buscar

João Alvarenga

Bolinho caipira

22 de Março de 2025 às 21:00
.
. (Crédito: DIVULGAÇÃO)

Pegando carona no Projeto de Lei 4772/24, de autoria da deputada federal, Simone Marquetto, que visa criar o Dia Nacional do Tropeiro, visitaremos, neste artigo, as cozinhas do passado, para falar sobre a nossa rica gastronomia regional que, infelizmente, as novas gerações pouco conhecem. Talvez, o leitor possa se questionar: afinal, o que há em comum o tropeirismo com a culinária? É o que veremos.

Levando-se em conta o fato de que o tropeirismo representou um momento auspicioso não só para nossa região, mas para o País, é possível conjecturar que os pratos típicos da nossa região têm fortes laços com esse importante ciclo econômico. Não só isso! Foi graças à figura do tropeiro — tão bem retrata pelo artista Mário Mattos — que essa culinária ainda é consumida, numa espécie de resistência ao fast food.

Outra dúvida: afinal, como se estabelece essa ponte entre o tropeirismo e a culinária regional? A explicação pode parecer delírio, tanto que se existirem equívocos, que os historiadores tomem a palavra. Vamos imaginar que, na rota entre Sorocaba e o Rio Grande do Sul, os tropeiros faziam seus pontos de paradas que, posteriormente, tornaram-se pequenos vilarejos e até cidades. Aliás, muitas cidades da nossa região “nasceram” a partir desse processo.

Assim, ao fazerem pouso, com seus muares, nesses locais, tomavam contato com os costumes e, por natureza, a comida que ali era servida. Quem sabe, esses pratos também eram levados para outras localidades, havendo uma espécie de intercâmbio gastronômico. Isso, amigo leitor, é só uma hipótese. E que, talvez, renda até uma tese de mestrado. Caso haja algum pesquisador interessado, fica aí a sugestão.

Logo, está longe de ser exagero afirmar que não só a economia ganhou impulso, no século 19, como houve, também, uma difusão ampla das receitas caseiras que eram passadas oralmente às famílias, de geração em geração. Aliás, o popular feijão tropeiro, o principal símbolo gastronômico daquele período, permanece no cardápio de muitos restaurantes, além de outros pratos que ganham ares de “comida rústica”, tais como: arroz carreteiro, arroz com frango e o espeto rojão (carne suína enrolada num espeto de madeira), de Ribeirão Grande.

Isso sem citar os maravilhosos doces caseiros da vizinha Tatuí, que são verdadeiras relíquias guardadas a sete chaves pelas famílias. Detalhe: longe do tom pejorativo de outrora, o termo “rústico”, agora, evidencia a importância de nossas raízes, tanto tropeira quanto caipira. Aliás, a figura do caipira, infelizmente, tornou-se personagem pitoresco, lembrado apenas no que sobrou das boas e antigas festejas juninas.

Além dos pratos citados, destacamos, ainda, o famoso bolinho de frango, também conhecido como bolinho caipira, bolinho de colher ou encapotado. Isso depende da localização em que você esteja na região. Inclusive, há quem diga que esse bolinho, feito de farinha de milho com recheio de frango, teria “nascido” em Itapetininga (que, por sinal, estava na rota dos tropeiros) e que, só depois, “migrou” para outras cidades, com nomes diversos, além de pequenas variações na textura da massa e no recheio.

Por exemplo, em Taquarivaí e Ribeirão Branco, os fãs o conhecem por “encapotado”, pois a massa é mais grossa, de maior proporção e recheio generoso. Em Sorocaba, temos a sua versão light, com uma massa mais lisa do que de costume e menos gorduroso. Tanto que os da geração 60+ brincam que o bolinho deixou de ser caipira, porque se “urbanizou”. Brincadeiras à parte, no fundo, é fundamental destacar que se trata de uma das iguarias mais tradicionais da nossa região, largamente consumida.

Das memórias da infância, vem à imagem do saudoso “Bar Paixão”, em que a esposa do senhor João Paixão, a senhora Rosinha, fritava-os em óleo bem quente, a fim de garantir a crocância. Afinal, não havia air flyer. Se houvesse, talvez, não ficasse tão saboroso. Bom domingo!

João Alvarenga é professor de redação.