João Alvarenga
Bioarte: revolução ou delírio?

Você já ouviu falar em “Bioarte”? Pois bem, esse é o nosso assunto deste domingo. Todavia, explicar o que isso significa não será uma tarefa tão fácil, porque há pouca teoria sobre esse assunto que se apresenta como uma nova visão do mundo das artes. Assim, vamos tentar entender as bases desse conceito que já se faz presente em algumas galerias de arte; a fim de compreender o motivo de tantas polêmicas. Afinal, essas manifestações representam, de fato, uma “revolução” estética, como postulam seus adeptos, ou tudo não passa de mero delírio? Leia este artigo e tire suas próprias conclusões.
Nosso ponto de partida é a pergunta: o que é “Bioarte”? O diretor artístico, Marcelo Dantas, em recente episódio do Café Filosófico, pela TV Cultura, salienta que se trata de uma nova concepção artística que parte do princípio de que natureza não seja apenas retratada, como ocorreu nas pinturas em telas, ao longo de toda a história das artes, desde os desenhos rupestres. Ou seja, antes, os artistas apenas registravam o “nature ocaso” (natureza morta). Exemplos: “Os girassóis” de Van Gogh (de 1888) ou os “Jardins de Monet”, em que o artista pintou as quatro estações, entre outras criações.
Agora, os filiados à “Bioarte” defendem a ideia de uma arte mais orgânica e “colaborativa”, como se a natureza fosse parceira dos artistas. Essa visão prega a fusão entre Biologia e Artes Plásticas. Com isso, a natureza perde o título de “musa” inspiradora da criação, como no passado, para ser um elemento ativo do processo. Se, outrora o pintor fazia uma simples imitação do meio ambiente, como forma de “eternizar” a beleza captada momentânea, na “Bioarte”, os elementos da natureza atuam ativamente no processo criativo, numa espécie de resposta ao pensamento do antropólogo francês, Levy Strauss: “A cultura é a natureza transformada”.
Mas, qual a origem dessa mentalidade? Dantas dispara: “A arte não é uma invenção humana!” O diretor de artes é contrário à tese de que só o ser humano é capaz de criar artisticamente, como os teóricos defendem há séculos. “Tal pensamento cai por terra, quando contemplamos a natureza.” Dantas, radicaliza, ao afirmar: “os passarinhos estão cantando há milhares de anos e muito mais afinados do que qualquer voz humana”. Acrescenta: “As formigas, as aranhas e as abelhas produzem arquitetura por muito mais tempo do que homo sapiens”.
No seu entender, a linguagem da natureza é ampla, bela, complexa e inesgotável. Logo, por ser um algo impactante, tal conceito tem encontrado resistência até entre os próprios artistas, pois há quebras de paradigmas, desde os primórdios da arte. Por isso, essa ideia (ainda) não foi digerida até mesmo por quem é do ramo. Graças à complexidade, é pouco assimilada por quem não convive com a linguagem artística ou não frequenta galerias.
Para Dantas, a arte é “uma janela para outro” que transcende a ideia estática do autorretrato. Para ele, a “Bioarte” propõe um novo diálogo do ser humano com os biomas, a fim de garantir a preservação dessas estruturas sensíveis. Isso exige que as pessoas tenham mente mais aberta e passem a ver uma teia de aranha como um “objeto de arte”.
Já o professor de História da Arte, Cláudio Fernandes, em seu site, defende o pensamento de que a criação artística é algo inerente à nossa espécie. Afirma: “O homem, por ser um ser histórico, e não meramente natural (no sentido biológico), lança-se à produção simbólica”. Para o professor, as artes são a etapa mais complexa desse processo. “As técnicas empregadas na escultura revelam nossa capacidade de dar forma e significado a uma matéria natural bruta”.
Finalizando, para o escritor Jair Ferreira dos Santos, autor da obra “O que é pós-modernismo”, o casamento das artes com a tecnologia gerou a “dessacralização das artes”, tornaram-se mercadorias baratas. Por isso, a “Bioarte” veio para dar um novo sentido à arte. Bom domingo!
João Alvarenga é professor de redação.