Celso Ming
Menos pão, mais canhão

O presidente Donald Trump não está apenas determinado a adotar uma radical política protecionista de comércio exterior. Está determinado, também, a desengajar os Estados Unidos de sua função de garantidor da segurança global. Isso terá consequências não apenas para países geopoliticamente ameaçados, mas também para o Brasil.
Trump já avisou que não está mais disposto a financiar a guerra da Ucrânia contra a Rússia. Determinou que a União Europeia aumente sua fatia destinada à defesa e, nessas condições, empurrou definitivamente a Alemanha para o rearmamento. O Japão, outro derrotado na Segunda Guerra Mundial, também passou a destinar mais recursos para sua defesa, especialmente contra eventuais ameaças da China.
Esses novos ventos já começam a produzir efeitos de grande relevância. A ampla aliança militar que envolve os membros da Organização do Atlântico Norte (Otan) está agora abalada. A Polônia, que sempre foi espremida entre potências geopolíticas, sente que, depois da Ucrânia, pode ser a próxima peça do dominó a tombar sobre o tabuleiro. Seu primeiro-ministro, Donald Tusk, declarou no início do mês que: “estaremos mais seguros se tivermos nosso próprio arsenal nuclear”. Turquia e Hungria também parecem se sentir sob ameaça. A Coreia do Sul se vê à beira do abandono pelo seu aliado histórico, numa situação em que sua metade ao norte redobra as intimidações. Taiwan também começa a temer pelo seu futuro.
Não está nem um pouco claro até onde e até quando a nova ordem global pretendida pelo presidente Trump acabará prevalecendo. Apesar dessa incerteza, a percepção geral é a de que não dá para ficar à espera de qualquer definição. Como a História nos ensina, desde já o jogo global das alianças e das defesas entre estados e blocos de estados, também começa a mudar.
Essas transformações não deverão limitar-se ao Hemisfério Norte. O Brasil e seus vizinhos latino-americanos também serão envolvidos pelas novas relações de força. Não há nenhuma razão para acreditar que a Organização dos Estados Americanos (OEA) permanecerá incólume. Pode ser o momento do crepúsculo da bicentenária Doutrina Monroe, o compromisso de todos os países americanos de não admitir novas interferências neocolonialistas no Continente. Se for por aí, parece inevitável que as forças armadas dos principais países da América do Sul também se batam pelo reaparelhamento do seu poderio.
O Brasil apresenta sérias vulnerabilidades diante do crescimento do crime organizado e da ação dos narcotraficantes. Tem uma ampla rede de transmissão de energia elétrica, portos, aeroportos, rodovias e plataformas de petróleo excessivamente expostos a eventuais ataques que poderiam paralisar a economia.
Pior ainda , o Brasil não dispõe de um programa de desenvolvimento de defesa, num momento em que o guarda-chuva de proteção mantido até agora pelos Estados Unidos ameaça se fechar, sabe-se lá até quando.
Celso Ming é comentarista de economia.