Presença: Uma lenda do futebol sorocabano
O herói Ademir de Barros, o Paraná. Crédito da foto: Acervo Pessoal
Ele nasceu no interior do Paraná, mas veio para Sorocaba no começo da adolescência. Ademir de Barros em pouco tempo conquistou a cidade com sua grande habilidade com a bola. Dos campos de várzea e das brincadeiras com a molecada da Árvore Grande surgiu um grande jogador profissional, que passou pelo São Bento e São Paulo e logo foi para na seleção, defender a camisa canarinho. Conheça a história desse jogador excepcional e ser humano de bom coração.
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Como foi sua infância? Quais lembranças tem dos seus pais e familiares?
Eu nasci na cidade de Cambará, no interior do Paraná, no dia 21 de março de 1942 e desde criança eu joguei futebol, porque a família toda jogava. Meus avós tinham uma pensão onde moravam os jogadores em Cambará, minha tia Luiza também tinha uma pensão onde moravam os jogadores. Eu praticamente vivi dentro do campo, porque tinha meus tios que jogavam também, e eles iam para o campo aos sábados. Eu sempre fui abusado. Sábado eles tinham os treinos e eu ia junto e sempre dava um jeito de chegar perto da bola. Além disso, meu pai foi jogador de futebol, jogou na Esportiva Jacarezinho, chegando a ser eleito o melhor jogador do norte do Paraná em 1949.
Como foi a sua vinda para Sorocaba?
Meu tio Antônio (pé de chumbo) começou a jogar no São Bento. Aí ele falou para o meu pai: “Anísio, está fazendo nada aí mesmo, trabalhando carregando saco, vamos trabalhar em Sorocaba. A gente arruma uma fábrica de linho lá para você, você vai trabalhar lá, e daí você leva a família.” Chegamos aqui em 1954, nos instalamos primeiro em Santa Terezinha e depois na Árvore Grande.
Como foi seu começo em Sorocaba?
Naquela época os tempos era difíceis, meu pai e a mãe falavam assim: “você vai estudar, vai estudar datilografia, aprender a escrever à máquina”. E minha mãe me colocou na uma escola de datilografia dos Fazano, na rua da Penha. Eu comecei a ir, e meu pai trabalhando. A gente passava necessidade, então se tivesse mais gente para trabalhar, para ajudar, era bom. Um dia, indo para a escola, peguei um pedaço de jornal no chão, vi um anúncio me chamou atenção: “precisa-se de um menino para trabalhar na gráfica do jornal Cruzeiro do Sul”. Aí eu falei: “não vou nem para a escola, vou direto”. Eu fui lá, arrumei serviço, para começar no outro dia. Cheguei em casa, fui falar com minha mãe. Ela não queria, mais eu falei: “eu vou trabalhar mãe, é melhor”. Ela estava trabalhando também de empregada doméstica. Comecei a trabalhar no Cruzeiro do Sul e minha mãe levava almoço para mim todos os dias na praça central.
E nessa época conseguia trabalhar, estudar e ainda jogar bola?
Tinha um o redator de esportes do jornal Cruzeiro do Sul, era o Aldair Sansão, ele tinha um time de futebol do jornal e eu sempre pedia pra ele deixa eu jogar. Ele falava que eu era muito magrinho, que ia quebrar minha perna e seu Nelson ia mandar nós dois embora. Mas consegui convencê-lo a jogar.
Como foi parar no São Bento?
Fui convidado para ir jogar em um domingo, lá no campo do Estrada. Naquela época tinha primeira e segunda quadra, eu joguei segunda quadra, de meio de campo, volante, e ganhamos o jogo. Eu fiz dois gols, jogando de volante. Aí eles falaram assim comigo: “você vai ficar, vai ficar na reserva do time titular”. Descobri, depois, que dois jogadores do São Bento eram do bairro Árvore Grande, onde eu morava. Conversei com eles, como eu não tinha idade, 13 anos, não tinha 15 ainda, não pude me inscrever. Daí apareceram lá com a carteirinha com a minha fotografia mostrando que era mais velho.
Fique jogando pelo São Bento até que aos 14 anos meu pai falou assim: “o pessoal do Teba quer que você vá lá para você jogar, eles vão arrumar um serviço para você, agora que você já fez 14, e vai jogar no time da fábrica”. Aí fui. Naquela época tinha um salário de menor, então entrei na fábrica para trabalhar. Entrava às 5h da manhã, saia às 2h, treinava e jogava no time da fábrica. Nós fomos vice-campeão amador, eu joguei com a maioria dos veteranos que tinha naquela época em Sorocaba, que jogavam na Várzea. Joguei com uns jogadores que serviam até para ser meus avôs. Depois do Teba, no outro ano, o São Bento me convidou outra vez para ir para lá. Eu não queria ir, por causa do emprego na fábrica. Fiquei mais um ano na fábrica e no outro fui para o São Bento. Fiquei no amador, comecei a treinar junto com o profissional, assinei o contrato com São Bento com 17 anos. Comecei a jogar no São Bento, jogava de centroavante, meio de campo, meia, até ir parar na ponta esquerda.
Como chegou no São Paulo?
O São Bento em 62 conquistou o primeiro acesso à elite do futebol paulista. Naquela época o São Bento emprestou do São Paulo jogador Bazzani. Depois disso o pessoal do São Paulo ficou de olho em mim e acabei indo para lá.
O que lembra da sua passagem pelo São Paulo?
Foram nove anos atuando pelo Tricolor Paulista. Vi muitos pontas passarem por lá. Eu nunca fui craque, mas jamais afinei. Eu queria é jogar, pela camisa do São Paulo, participar do time que foi bicampeão paulista em 1970/71, acabando com um jejum de mais de uma década. Foram 394 partidas com 196 vitórias, 97 empates, 101 derrotas e 40 gols marcados, segundo o Almanaque do São Paulo, feito Alexandre da Costa.
Você chegou a quase jogar no Corinthians?
Em 1959, estava jogando campeonato amador pela Teba, até que eles me falaram que não iriam me pagar mais meu salário. Um tio meu, que morava em São Paulo, estava nos visitando na época e me levou até a capital falar com jornalista Aurélio Belotti, da A Gazeta Esportiva. Ele conseguiu um teste pra mim no Corinthians. Fiz um treino no time juvenil. Quando terminou, eles falaram que tinham gostado e que era para eu voltar. Fui lá, tomei banho e quando fui me trocar a minha chuteira tinha sumido. Reclamei com o roupeiro, ele procurou e não achou. Tinham roubado. Fui embora e não voltei mais.
Você foi responsável pelo primeiro gol da história do estádio Jacy Scaff (Estádio do Café) na partida entre Londrina e Flamengo. O jogo terminou empatado em 1 a 1. Você fez o gol de pênalti. Como é para um jogador ter seu nome marcado na história de um estádio?
É uma coisa muito gostosa ser lembrado todos os anos por isso. Para quem gosta de futebol, seja amador ou profissional, o estádio é um lugar sagrado, onde os sonhos se tornam realidade.
Na Copa de 1966, como foi vestir a camisa da seleção?
Naquele mundial, o Brasil ficou em 11º lugar. Consegui jogar três partidas, venci uma contra a Bulgária, perdi duas contra Hungria e Portugal. A seleção daquele mundial era a seguinte: Manga, Fidélis, Brito, Orlando e Rildo; Denílson e Lima; Jairzinho, Silva, Pelé e Paraná. Foram convocados ao todo 46 jogadores. Fui escalado para jogar machucado. Tinha oito pontos na perna, depois de receber um carrinho no primeiro jogo da Copa. Pela seleção eu joguei 11 vezes, com nove vitórias e duas derrotas. Marquei um gol contra o Peru no dia 4 de junho de 1966, quando o Brasil venceu por 4 a 0.
E você acha que o futebol mudou muito daquela época para hoje em dia?
Mudou, não tem mais aquele romantismo que tinha antigamente.
Em 1975, Paraná foi para Operário Futebol Clube (MS) para disputar o campeonato brasileiro. Posteriormente voltou ao estado do Paraná, com passagens pelo Colorado Esporte Clube e pelo Londrina Esporte Clube.
Paraná ainda retornou ao cenário paulista para jogar novamente pelo São Bento e pela Associação Atlética Francana em 1978. Depois foi parar no Barra Bonita, lá permanecendo até 1980, quando decidiu encerrar a carreira.
Atualmente, é um dos diretores do Panathlon Club de Sorocaba. Pratica caminhadas e ainda mantém os hábitos saudáveis com a quarentena devido ao Covid-19. Não tem ido quase que diariamente até o centro da cidade, mais não vê a hora de poder encontrar os seus amigos novamente.
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