Segundo turno entre a Covid-19 e a população
Éric Diego Barioni
Vou iniciar este texto com uma reflexão breve, e quero que você imagine o que vou lhe descrever: com o vírus SARS-CoV-2 localizado no centro de um espaço, e entre o vírus e as inúmeras vítimas desta pandemia que, mais tarde, nesta minha reflexão, irão delimitar um círculo no entorno do vírus central, estamos nós -- eu e você --, transitando de um ponto a outro, até que, por acidente, nos juntemos às demais vítimas da Covid-19, e aumentemos a espessura desta linha.
O Brasil já registrou mais de 6 milhões de casos confirmados e 175 mil mortes, e para fins somente de reflexão aqui, com todo o meu respeito, quero classificar as pessoas que estão nos números que citei acima como vítimas diretas da Covid-19. Para além destas vítimas, familiares que perderam pessoas queridas, colaboradores de empresas, profissionais liberais, autônomos, comerciantes, artistas, entre outros, também serão caracterizados aqui como vítimas, porém como vítimas indiretas.
Nós, eu e você, transitamos entre o vírus na parte central, e estas pessoas -- as vítimas --, que delimitam o espaço do círculo, como uma linha contínua que separa o que está dentro do que está fora. A cada vez que chegamos próximos ou tocamos o vírus, seguimos como vítimas diretas ou indiretas para a periferia do círculo, compondo aquela linha imaginária e diminuindo o espaço de circulação por aumentar cada vez mais a espessura da linha. Esta diminuição de espaço nos aproxima do vírus, e acaba por gerar mais e mais vítimas diretas e/ou indiretas, prejudicando o funcionamento do sistema.
E não é que, com tudo isso, conseguimos chegar até aqui? Em plena pandemia de Covid-19. A pandemia não acabou, embora muitas pessoas se comportem como se ela não existisse mais. Isso é fruto da nossa falta de compreensão sobre o problema, fruto da nossa falta de conexão com a realidade e, entre outras coisas, empatia, tolerância e respeito para com o próximo. Enfim, tal como para alguns o planeta Terra é plano, para outros o vírus é fruto de conspiração e a pandemia é manobra política. Veja: a pandemia não é manobra política. A pandemia é uma crise mundial de saúde pública e econômica, e alguns políticos, sim, infelizmente, fazem certas manobras utilizando a pandemia de escudo.
Até ontem (não) estava tudo bem, pode acreditar! Porém estávamos na fase verde do Plano São Paulo, e então de repente, ao acordar após as eleições, voltamos para a fase amarela. Covid-19, nova onda, restrições, Natal e muita preocupação. Alguém pode perguntar: o vírus e a pandemia oferecem riscos à população e à saúde pública somente após as eleições -- ou melhor, somente após o segundo turno das eleições? Obviamente, a resposta é não. Porém, para além das estratégias e manobras políticas, que podem ou não ser justificáveis ou adequadas, o nosso comportamento neste vai e vem do círculo pode gerar mais e mais vítimas, aumentando a espessura desta linha e limitando a nossa liberdade.
Compreenda a importância do papel daqueles que transitam entre o vírus e as vítimas. Compreenda a importância do uso de máscaras e demais cuidados de higiene, mesmo em restaurantes (vítimas indiretas), afinal de contas não devemos utilizar certos lugares como refúgio para o não uso de máscaras. Adicionalmente, não posso deixar de citar que muitos locais estão afrouxando os cuidados, e isso não pode ocorrer. Todos nós somos responsáveis não somente pela proteção das vítimas diretas, mas também pela proteção e cuidado para com o trabalho das vítimas indiretas, e cabe a todas elas o nosso respeito.
Éric Diego Barioni ([email protected]) é professor doutor na Uniso, conselheiro no Conselho Regional de Biomedicina da 1ª Região (CRBM-1) e presidente da Comissão de Toxicologia do CRBM-1.