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Inclusão

Os desafios em torno do autismo

Preconceito e falta de informação atrapalham diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista

23 de Junho de 2021 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
Estima-se que existam cerca de 2 milhões de pessoas com autismo no Brasil.
Estima-se que existam cerca de 2 milhões de pessoas com autismo no Brasil. (Crédito: DIVULGAÇÃO)

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) se caracteriza pelo déficit em duas grandes áreas: falta de comunicação e interação social; e a presença de comportamentos estereotipados repetitivos ou interesses restritos. Em alguns casos, há também uma regressão, as crianças começam a perder a capacidade de falar.

Segundo o Dr. Carlos Gadia, especialista brasileiro que há mais de 30 anos vive e trabalha em Miami (Estados Unidos) -- considerado por muitos o “papa” em diagnóstico e prognóstico das chamadas desordens do desenvolvimento neurológico que afetam a interação social e a comunicação dos pacientes dentro do espectro autista -- tais sintomas podem se manifestar em níveis diferentes a partir dos 18 meses de vida.

Por razões estatísticas, é importante que pais e profissionais de saúde fiquem atentos ao desenvolvimento do bebê, já que, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), os sintomas atingem uma a cada 160 crianças.

Historicamente, se descobre que o paciente se enquadra no espectro autista quando a criança já está com três ou quatro anos de idade. E, para piorar, a maior parte começa a ser tratada quando já tem cinco ou seis anos. O tratamento tardio posterga os benefícios que, por exemplo, as terapias de fonoaudiologia podem proporcionar, se começadas precocemente.

Não por acaso, Gadia defende a alteração no currículo de graduação das faculdades relacionadas à área de saúde (e até da educação infantil) com a introdução de informações sobre o TEA e como fazer uma leitura simples dos sinais descritos abaixo, que devem ser observados por profissionais de saúde, professores e pais.

Indicações absolutas para recorrer a uma avaliação mais detalhada:

1) Ausência de balbuciar aos 12 meses

2) Ausência de gestos aos 12 meses (apontar, abanar)

3) Ausência das primeiras palavras aos 16 meses

4) Ausência de combinações de 2 palavras espontaneamente (não-ecolálicas*) aos 24 meses

5) Qualquer perda de linguagem ou habilidades sociais em qualquer idade

*Ecolálica: quando uma criança repete o que uma outra pessoa fala, mas de forma involuntaria, não refletindo um aprendizado ou intencionalidade.

Papel dos pais

“Os profissionais de saúde devem escutar as mães, que são as primeiras a se darem conta de que alguma coisa não está certa com seu filho”, afirma Gadia. Os médicos precisam fazer as perguntas corretas, mas se os pais forem treinados a identificar os sinais, eles trarão as respostas para o diagnóstico: “Crianças que não balbuciam aos doze meses, que não estão dizendo palavras aos dezesseis meses, que não estão colocando duas palavras juntas aos vinte e quatro meses... São sinais de alerta”.

A comunidade científica se aproxima cada vez mais das causas da desordem do sistema nervoso que podem levar ao TEA. Há uma linha de investigação sobre pré disposição genética, na China, por exemplo, que relaciona a permeabilidade do intestino com os problemas no sistema nervoso. Cientistas do Peking University First Hospital, em Beijing (China), publicaram no periódico científico Frontiers uma extraordinária metanálise de 150 estudos realizados em todo o mundo desde a década de 1960, relacionando o equilíbrio da flora intestinal e o TEA. Toxinas produzidas pelo Lactobacillus -- que num intestino normal seriam eliminadas com as fezes -- podem estar sendo secretadas no organismo e afetando o sistema nervoso.

“Há genes que são gatilhos e outros, que ausentes, propiciam o aparecimento do transtorno”. Tudo isso ainda está no futuro. Há uma distância entre as pesquisas laboratoriais, a realidade dos pacientes e dos pais que sofrem com a ausência de centros de atendimento, por exemplo, aqui no Brasil, onde se estima existam 2 milhões de pessoas com autismo.

Não existem medicações para autismo. Os medicamentos, quando indicados, servem apenas para diminuir a ansiedade e comportamentos hiperativos ou agressivos que impedem a introdução ou evolução de terapias comportamentais e/ou fonoaudiólogas.

Os pais são a chave para aplicação destas terapias. “Quando treinados, eles conseguem reproduzir o que deve ser feito para buscar a melhoria da qualidade de vida do paciente”, finalizou Gadia.

Denis Deli é jornalista, especializado na inclusão da pessoa com deficiência.